quinta-feira, 17 de julho de 2014

Crime Continuado

O conceito de crime continuado se encontra no art. 71, caput, do Código Penal. De acordo com tal dispositivo, “quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro”.
A finalidade do instituto é a de evitar a aplicação de penas exorbitantes, pois a consequência do reconhecimento da continuidade delitiva é a aplicação de uma só pena, aumentada de 1/6 a 2/3 (sistema de exasperação).

Aplicação de pena
No crime continuado, os delitos devem ser necessariamente da mesma espécie. Crimes cometidos em sua modalidade simples e também na qualificada, quando atingem exatamente os mesmo bens jurídicos, são tidos como de mesma espécie.
Por isso, o art. 71, caput, do CP, rechaça que, nas hipóteses de continuação criminosa, aplica-se a pena de um só dos crimes, se idênticos, ou a mais grave, se diversos, aumentada, em qualquer caso, de 1/6 a 2/3.
O juiz, na escolha do quantum de exasperação, deve levar em conta o número de infrações perpetradas. Quanto maior o número de delitos componentes da continuação, maior deverá ser o índice de aumento.

Requisitos
O art. 71 do Código Penal expressamente exige os seguintes requisitos para o reconhecimento do crime continuado:

a) Pluralidade de condutas – o mesmo agente deve praticar duas ou mais condutas. Se houver somente uma conduta, ainda que desdobrada em vários atos ou vários resultados, o concurso poderá ser formal.

b) Pluralidade de crimes da mesma espécie – são aqueles previstos no mesmo tipo penal, simples ou qualificados, tentados ou consumados.

c) Que os crimes tenham sido cometidos pelo mesmo modo de execução – por esse requisito, não se pode aplicar a regra do crime continuado entre dois roubos, quando, por exemplo, em deles tiver sido cometido mediante violência e o outro, mediante grave ameaça.

d) Que os crimes tenham sido cometidos na mesma condição de tempo (conexão temporal) – a jurisprudência vem admitindo o reconhecimento de crime continuado quando entre as infrações penais não houver decorrido período superior a 30 dias.  Nesse sentido: "Quanto ao fator tempo previsto no art. 71, do Código Penal, a jurisprudência sedimentada no Supremo Tribunal Federal é no sentido de observar o limite de trinta dias que, uma vez extrapolado, afasta a possibilidade de se ter o segundo crime como continuação do primeiro" (STF - HC 69.896-4 - Rel. Min. Marco Aurélio). Entretanto, se ficar constatado tratar-se de criminoso profissional ou habitual, que comete crimes quase que diariamente como meio de vida, não tem direito ao benefício.

e) Que os crimes tenham sido cometidos nas mesmas condições de local (conexão espacial) – admite-se a continuidade delitiva quando os crimes forem praticados no mesmo local, em locais próximos ou, ainda, em bairros distintos da mesma cidade e até em cidades vizinhas. Nesse sentido: “o fato de serem diversas as cidades nas quais o agente perpetrou os crimes (São Paulo, Santo André e São Bernardo do Campo) não afasta a reclamada conexão espacial, pois elas são muito próximas umas das outras, e integram, como é notório, uma única região metropolitana” (STF, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, RT 542/455).

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Crime continuado específico
A atual redação do art. 71, parágrafo único, do Código Penal expressamente admite a continuação delitiva ainda que os crimes sejam dolosos, cometidos contra vítimas diferentes e com emprego de violência à pessoa ou grave ameaça. Ocorre que, nesses casos, o juiz pode até triplicar a pena de um dos crimes (se idênticos) ou do mais grave (se diversas as penas), considerando, para tanto, os antecedentes do acusado, sua conduta social, sua personalidade, bem como os motivos e as circunstâncias dos crimes. Nesse sentido: “ao paciente foi reconhecida a presença de continuidade específica nas tentativas de homicídio duplamente qualificado. O aumento da pena em razão do crime continuado se fundamentou na regra consoante a qual nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas até o triplo (CP, art. 71, parágrafo único), levando em consideração as circunstâncias judiciais do art. 59, do Código Penal, especialmente as de índole subjetiva. 8. Houve adequada e expressa fundamentação no acórdão do Tribunal de Justiça a respeito do fator de aumento da pena corporal em razão do crime continuado específico, havendo apenas o limite da pena fixada pelo crime continuado não ultrapassar a pena do concurso material, o que foi rigorosamente observado no julgamento da apelação” (STF, HC 92.819/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 15.08.2008, p. 841).

Direito penal esquematizado: parte geral / André Estefam e Victor Eduardo Rios Gonçalves; coordenador Pedro Lenza. – 3. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2014. p. 585 – 590.

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