De
quem deve pagar
Não é apenas o devedor
que está legitimado para efetuar o pagamento. Em primeiro plano o sujeito
passivo da relação obrigacional é o devedor, ou seja, o pessoa que contraiu a
obrigação de pagar. Entretanto também poderá solver o débito pessoa diversa do
devedor – o terceiro – esteja ou não juridicamente interessada no cumprimento
da obrigação (art. 304 do CC).
Art.
304. Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o
credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor.
Parágrafo
único. Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em nome e à
conta do devedor, salvo oposição deste.
Existem duas espécies
de terceiro:
a) Terceiro
interessado – pessoa que, sem integrar o polo passivo da relação
obrigacional-base, encontra-se juridicamente adstrita ao pagamento da dívida, a
exemplo do fiador que se obriga ao cumprimento da obrigação caso o devedor não
o faça.
b) Terceiro
não interessado – pessoa que não guarda vinculação jurídica com a relação obrigacional-base,
por nutrir interesse meramente moral. É o caso do pai que paga a dívida o filho
maior ou do amigo que honra o débito de seu compadre.
Em
tais casos duas situações podem ocorrer:
a) O
terceiro não interessado paga a dívida em
nome e a conta do devedor – neste caso, não tem, a priori, o direito de cobrar o valor que desembolsou para solver a
dívida, uma vez que o fez por solidariedade.
b) O
terceiro não interessado paga a dívida em
seu próprio nome – neste caso tem o direito de reaver o que pagou, embora
não se sub-rogue do direitos do credor.
É necessário uma
importante observação. Não é algo muito comum alguém se predispor a pagar
dívida de outrem.
Por isso, o direito não
ignora que pessoas movidas por razões egoísticas, poderão valer-se da
legitimidade conferida a terceiro não interessado para se tornarem credoras do
devedor, piorando a situação econômica destes.
Para evitar tal
situação o Código Civil de 2002 reconhece ao devedor a faculdade de opor-se ao
pagamento da dívida por terceiro, quando houver justo motivo para tanto:
Art.
306. O pagamento feito por terceiro, com desconhecimento ou oposição do
devedor, não obriga a reembolsar aquele que pagou, se o devedor tinha meios
para ilidir a ação.
A
quem se deve pagar
Segundo a legislação em
vigor, o pagamento poderá ser feito a seguintes pessoas:
a) Credor;
b) Representante
do credor;
c) Terceiro.
É o que prevê o art.
308 do CC-02.
Art.
308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente,
sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em
seu proveito.
Em primeiro plano, o
pagamento deve ser feito ao próprio credor (accipiens),
sujeito ativo titular do crédito. Nada impede, outrossim, que o devedor se
dirija a um representante legal ou convencional do credor, para efetuar o
pagamento. Tal ocorre quando o pai, representante legal do filho, recebe
numerário devido a este, em virtude de um crédito existente contra terceiro. Da
mesma forma, o credor pode, por meio da representação convencional ou
voluntária, outorgar poderes para que o seu procurador possa receber o
pagamento e dar quitação.
Pode ocorrer que uma
pessoa – diversa do credor e sem poderes de representação – apresente-se ao
devedor e receba o pagamento. Nesse caso, se o devedor não tomou as cautelas
necessárias, efetuando o pagamento para um sujeito qualquer, poderá sofrer as
consequências de seu ato, traduzidas pelo ditado “quem paga mal, paga duas
vezes”. O direito não socorre os negligentes (dormientibus ne sucuriti jus), e, no caso, se não cuidou de
investigar a legitimidade do recebedor, poderá ser compelido a pagar novamente
ao verdadeiro credor.
No caso de pagamento
feito a terceiro, ressalva a lei, todavia, a possibilidade de o credor
ratificá-lo ou reverter em seu proveito o pagamento recebido, conforme a art.
310 do CC.
Art.
310. Não vale o pagamento
cientemente feito ao credor incapaz de quitar, se o devedor não provar que em
benefício dele efetivamente reverteu.
Assim, se A, devedor de
B, paga a dívida a C, terceiro sem poderes de representação, o pagamento só
valerá se for ratificado (confirmado) por B, verdadeiro credor, ou, mesmo sem
confirmação, se houver revertido em seu próprio o proveito (ex: o devedor prova
que o credor recebeu o dinheiro do terceiro e comprou um carro).
Consoante bem declara
SILVIO VENOSA:
Para a estabilidade das
relações negociais, o direito gira em torno de aparências. As circunstâncias
externas, não denotando que o portador da quitação seja um impostor, tornam o
pagamento válido: ‘considera-se autorizado a receber o pagamento o portador da
quitação, exceto se as circunstâncias contrariarem a presunção daí resultantes
(art. 311, CC)’.
Situação especial de
pagamento feito a terceiro é aquele efetuado a credor aparente ou putativo.
Trata-se da pessoa que
se apresenta como sujeito ativo da relação obrigacional (sujeito passivo do
pagamento), não havendo razão plausível para o devedor desconfiar de sus
ilegitimidade.
Tendo em vista tal
situação o Código Civil dispõe em seu art. 309 que:
Art.
309. O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda que provado
depois que não era credor.
Requisitos
indispensáveis para a validade do pagamento ao credor putativo (aparente) são:
a) a
boa-fé do devedor;
b) a
escusabilidade de seu erro.
Por óbvio, a lei exige,
para que o pagamento seja admitido, que o devedor haja atuado de boa-fé, ou
seja, não possa supor, ante as circunstâncias de fato, que a pessoa que exige o
pagamento não tem poderes para tanto.
A boa-fé, no caso, é
subjetiva, um estado psicológico de firme crença na legitimidade daquele que se
apresenta ao devedor.
É indispensável,
também, embora não seja a lei explícita a respeito, que o erro em que laborou o
devedor seja escusável (perdoável). Se tinha motivos para desconfiar do
impostor, deverá evitar o pagamento, depositando-o em juízo, se for o caso.
Ainda pensando na
hipótese do pagamento feito a terceiro é possível que o credor seja credor do
credor, quando for penhorado o crédito, com a devida intimação do devedor de
que o débito está em juízo.
Art.
312. Se o devedor paga ao credor, apesar de intimado da penhora feita sobre o
crédito, ou da impugnação a ele oposta por terceiros, o pagamento não valerá
contra estes, que poderão constranger o devedor a pagar de novo, ficando-lhe
ressalvado o regresso contra o credor.
Assim, por exemplo, se
A deve a B a importância de 1.000,00, temos que tal crédito pode ser penhorado
pelos credores de B. Nesse caso, se C obtém a constrição judicial (penhora) de
tal crédito e, mesmo assim, A, ciente dela, paga a importância diretamente a B,
temos a aplicação da regra “quem paga mal, paga duas vezes”.
Gagliano,
Pablo Stolze. Novo curso de direito
civil, vol. 2: obrigações / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho. –
13 ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012. p. 150 - 161.
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