Um dos aspectos de
maior preocupação quanto ao menor é a questão do trabalho. Para se ter uma
ideia a Organização Internacional do Trabalho (OIT) editou 14 convenções sobre
a temática. Dentre elas, certamente, a mais importante é a Convenção 138 da
OIT, que determina a reunião de diversos assuntos das demais convenções, em
especial, estabelece regras de idade mínima para a admissão no emprego.
A referida convenção
pretende que os países membros adotem política de efetivação da abolição do
trabalho infantil sem estabelecer idade mínima exata, permitindo a fixação
conforme o nível de desenvolvimento de casa país, não podendo, todavia, se
inferior à idade de conclusão de escolaridade compulsória ou, em qualquer
hipótese, inferior a 15 anos. A convenção estabelece ainda que quando a
economia de um país estiver substancialmente desenvolvida, a idade mínima pode
ser reduzida a 14 anos. Ademais, trabalho que possa prejudicar a saúde e a
moral do menor não poderá ser desempenhado por menores de 18 anos, salvo a
partir dos 16 anos em casos particulares de autorização de autoridade
competente em caso de extrema necessidade.
No Brasil, signatário
da Convenção 138 da OIT, o ordenamento estabelece a vedação ao trabalho
perigoso e insalubre aos menores, fixando a idade mínima em 16 anos, salvo na
condição de aprendiz, a partir dos 14.
No âmbito nacional,
cabe ao Conselho Nacional de Erradicação ao Trabalho Infantil (Conaeti), órgão
vinculado ao Ministério do Trabalho, promover o trabalho de defesa do menor
contra abusos no mercado. Além do combate as piores formas de trabalho
infantil, a legislação brasileira seguiu a tendência internacionalista de
limitar a prestação de serviço do menor em certas atividades, como, verbi gratia, nos locais e serviços
perigosos e insalubres nos termos do artigo 405, I, da Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT).
Art.
405. Ao menor não será permitido o trabalho:
I.
Nos locais e serviços perigosos ou insalubres, constantes de quadros para esse
fim aprovado pela Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho.
Para assegurar a
observância a tal dispositivo, de tempos em tempos, o Ministério do Trabalho
edita portarias buscando divulgar a listagem de quais atividades se enquadram
no conceito de atividades insalubres e perigosas, sendo uma delas a de número
88 de 28 de abril de 2009.
A atual Carta
Constitucional permitiu o trabalho a partir dos 14 anos. Com o advento da
Emenda Constitucional 20/98, esse limite subiu para 16 anos e possibilitou o
trabalho aos maiores de 14 e menores de 16 anos apenas no caso de contrato de
aprendizagem.
Art.
7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a
melhoria de sua condição social.
XXXIII.
Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 (dezoito)
e qualquer trabalho a menores de 16 (dezesseis) anos, salvo na condição de
aprendiz, a partir dos 14 (quatorze) anos.
Esse limitador de idade
para o exercício do trabalho produz efeitos na vida cível dos menores. A
legislação civil brasileira prevê que os menores de 16 anos são absolutamente
incapazes para a prática de todos os atos da vida civil, ao passo que os
menores entre 16 e 18 anos são relativamente incapazes.
Art. 3º. São
absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I. Os
menores de dezesseis anos;
Art. 4º. São
incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:
I. Os
maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
Quando se projeta o contrato de trabalho sobre a capacidade do menor, a
jurisprudência tem entendido que os aprendizes, a partir dos 14 anos, tornam-se
relativamente incapazes, gozando os mesmos de certa autonomia para os atos da
vida civil como, por exemplo, firmar recibos de pagamento de salário. Todavia,
o relativamente incapaz permanece impedido de dar quitação ao empregador quando
às verbas rescisórias, salvo se estiverem assistidos pelos seus responsáveis
legais. Nesse sentido, é o artigo 439 da CLT.
Art. 439. É lícito ao menor firmar recibo de
pagamento dos salários. Tratando-se, porém, de rescisão de contrato de
trabalho, é vedado ao menor de 18 (dezoito) anos dar, sem assistência, dos seus
responsáveis legais, quitação ao empregador pelo recebimento da indenização que
lhe for devida.
A legislação brasileira é bastante rigorosa quanto ao trabalho do menor
e são muitas as medidas protetivas visando assegurar a sua dignidade. É vedado
de forma expressa no artigo 404 da CLT que o menor trabalhe em horário noturno,
considerado das 22 horas às 5 horas para os trabalhadores urbanos, das 20 horas
às 4 horas para os trabalhadores rurais da pecuária e das 21 horas às 5 horas
para os trabalhadores rurais da agricultura.
Art.
404. Ao menor de 18 (dezoito) anos é vedado o trabalho noturno, considerado
este o que for executado no período compreendido, entre as 22 (vinte e duas)
horas e as 5 (cinco) horas.
O Estatuto da Criança e do
Adolescente ainda proibiu o chamado trabalho penoso do menor (artigo 67, II).
Contudo, não existe na legislação brasileira conceito sobre o que venha a ser
exatamente trabalho penoso.
Art. 67.
Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de
escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é
vedado trabalho:
II.
Perigoso, insalubre ou penoso;
Se pensarmos que o princípio
trabalhista da continuidade da relação de emprego milita em favor do empregado,
este apenas poderá se desligar do emprego se pedir demissão, rescisão indireta
ou se for dispensado, com ou sem justa causa. Todavia, para o menor, a lei
prevê outra possibilidade de desligamento do emprego, que independe da vontade
nem do empregado, nem do empregador, mas de seus responsáveis legais. Todas as
vezes que os pais ou tutores acreditarem que o exercício do emprego pelo menor
diminua seu tempo de estudo, ou reduza o repouso necessário ao seu
desenvolvimento saudável ou mesmo prejudique sua formação moral, poderão
pleitear a rescisão do contrato de trabalho do menor, mesmo que não seja sua
vontade.
Outro fato que merece
destaque é que, durante o exercício do trabalho do menor, este tem o direito de
fazer coincidir o período de suas férias escolares com as férias do trabalho.
Não se trata de faculdade do empregado, mas de verdadeira obrigação nos termos
do artigo 136, parágrafo 2º da CLT.
Art.
136. A época de concessão das férias será a que melhor consulte os interesses
do empregador.
§2º. O
empregado, estudante, menor de 18 (dezoito) anos, terá o direito de fazer
coincidir suas férias com as férias escolares.
Outro elemento trabalhista
que deve ser adaptado para assegurar a dignidade do menor concerne à prescrição
dos direitos trabalhistas. Como os menores não possuem capacidade para o exercício
de todos os atos da vida civil, contra eles não corre o prazo de prescrição dos
direitos trabalhistas nos termos do artigo 440 da CLT.
Art.
440. Contra os menores de 18 (dezoito) anos não corre nenhum prazo de
prescrição.
Apesar de todos os mecanismos
legais nacionais e internacionais de proteção à dignidade do menor, ainda sim
existem brechas legais que vem permitindo a atividade do menor em certos
empregos. Tem sido comum, nos últimos anos, dentro do meio artístico, a
participação de crianças em atividades tais como participação em
teledramaturgias, programas infantis e filmes. Tais participações incluem por
parte dos menores a execução de ordens, existência de jornada de trabalho e
habitualidade. Inegável a existência em questão da relação de emprego. A
Constituição é expressa no sentido de que é vedado todo trabalho para menores
de 16 anos, salvo na condição de aprendiz e, ainda sim, a partir dos 14 anos.
A fundamentação legal alegada
para se admitir a atividade pelos menores encontra respaldo no artigo 68 do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Art. 68.
O programa social que tenha por base o trabalho educativo, sob responsabilidade
de entidade governamental ou não-governamental sem fins lucrativos, deverá
assegurar ao adolescente que dele participe condições de capacitação para o
exercício de atividade regular renumerada.
§1º.
Entende-se por trabalho educativo a atividade laboral em que as exigências
pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando
prevalecem sobre o aspecto produtivo.
§2º. A
renumeração que o adolescente recebe pelo trabalho efetuado ou a participação
na venda de produtos de seu trabalho não desfigura o caráter educativo.
A norma em questão cria a
figura do trabalho educativo. Mesmo nessa situação, o trabalho educativo deve
abranger somente menor a partir dos 14 anos.
Contudo, não tem sido a
posição da jurisprudência que vem admitindo a situação de menores de 14 anos
naquilo que se intitulam trabalho educativo. Para tanto, deve o empregador
requerer ao juiz da Infância e Juventude autorização nos termos do artigo 149,
parágrafo 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com oitiva do
Ministério Público.
Art.
149. Compete a autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou
autorizar, mediante alvará.
§2º. As
medidas adotadas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a
caso, vedadas determinação de caráter geral.
Outra fundamentação jurídica
que se tem alegado para admitir a prestação desse tipo de serviço por menores
de 14 anos é a do manto de censura. Quando se nega a participação de menores em
certas produções, alega-se censura.
Recentemente, uma polêmica
envolvendo maus-tratos por parte do dono de uma grande emissora e de uma
apresentadora de programa infantil, com 6 anos de idade na época levaram a
intervenção do Ministério Público Federal no caso, que instaurou inquérito
civil público para verificar violações e desrespeito à dignidade do ser humano
em desenvolvimento. Outras emissoras também têm sido condenadas, por contratarem
menores para participar de tramas sem antes aterem-se ao processo judicial de
autorização, conforme a jurisprudência abaixo:
RESP
278356 – ECA – PARTICIPAÇÃO DE MENOR EM ESPETÁCULO PÚBLICO – PROGRAMA DE TV-
ALVARÁ JUDICIAL. RECURSO ESPECIAL Nº 278.356 – RJ (20000095440-3).
EMENTA
ESTATUTO
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA); PARTICIPAÇÃO DE MENOR EM ESPETÁCULO PÚBLICO;
PROGRAMA TELEVISIVO; ALVARÁ JUDICIAL; IMPRESCINDIBILIDADE; ART. 149, II DO ECA;
MULTA; ART. 258 DO ECA; PRECEDENTES.
- Os programas de televisão têm natureza de
espetáculo público, enquadrando-se a situação na hipótese prevista no inciso
II, do art. 149 do ECA.
- A participação da criança e/ou adolescente
em espetáculo televisivo, acompanhado ou não dos pais ou responsáveis, não dispensa
o alvará judicial, a teor do disposto no art. 149, II do ECA.
- A
falta de alvará judicial autoriza a aquisição da multa prevista no art. 258 do
ECA.
-
Recurso especial não conhecido.
A regulamentação desse
trabalho é defendida por educadores, psicólogos, assistentes sociais e diversos
profissionais que conhecem, de perto, as condições a que são submetidas
crianças e adolescente que sonham em ingressar no mundo artístico. Mas não é
possível contentar-se apenas com as normas existentes, sendo necessária uma
regulamentação especifica e com visão voltada principalmente a dignidade do
menor que sofre com a angústia durante a seleção, pressão durante gravações e
exibições ao vivo, as longas jornadas e os prejuízos na frequência e rendimento
escolares.